«Rottamazione»
«Queríamos mudar a política e não conseguimos. Será belíssimo demonstrar agora que a política não nos mudará a nós» - Matteo Renzi
Vão fazer agora, por esta altura do ano, os primeiros 365 dias de mandato de Bruno de Carvalho, Presidente da SAD e do Conselho Executivo do Sporting Clube de Portugal. Para os que estão fora do ocorrido – que não deverão ser poucos – trata-se de um relativamente jovem indivíduo (quanto mais se o compararmos aos restantes), de 42 anos, que basicamente “pegou” numa entidade desportiva, toda ela afundada e mergulhada numa depressão em crescente, planeada e agonizada pelos chamados Viscondes de Alvalade, onde o estatuto, ao longo dos anos, se fez valer mais do que qualquer tipo de competências e qualidades (hoje, essas mesmas personalidades estão a ser investigadas por possíveis actos de gestão danosa..). Quase um ano depois, Bruno de Carvalho delineou um caminho firme para a revitalização do clube, tanto na parte financeira, como em entender ao máximo a ideologia sportinguista e aplicá-la ao máximo.
No fundo, com mais ou menos competência, com mais ou menos qualidade, trata-se de algo que, aí sim, é perceptível a todos os portugueses: mudança de mentalidade. Desde o desporto à política, já estamos fartos do cliché de observar constantemente as mesmas personalidades em posições de poder, agarrados a eles bem mais do que aos seus capachinhos, os mesmos discursos, a propaganda de promessas perto de cada eleição, e, em muitos dos casos, os interesses próprios e a ganância que se vai intensificando a cada tomada de posição, a cada movimento eleitoral, desde as propostas falaciosas ao mais pequeno (falso) sorriso para as câmaras.
Permitem-me levar-vos agora a Itália. Matteo Renzi nasceu em 1975 nos arredores de Florença, numa família da pequena burguesia. Teve educação católica, ajudou à missa e foi escuteiro. Em Novembro de 2012, desafiou Bersani nas primárias, e fazendo a sua campanha… numa rulote, obrigou o seu adversário, para surpresa geral, a ir a uma segunda volta. Perdeu mas conseguiu o mais importante: as sondagens apresentaram-no como o melhor candidato do PD – o seu partido – para vencer Berlusconi.
Hoje, recém-empossado primeiro-ministro italiano – o mais jovem de sempre no país – apresentou esta semana a sua “visão ousada” das reformas, prometendo uma “mudança radical e imediata” em Itália. Mesmo sendo vaiado sucessivamente pela oposição no Parlamento, sem vacilar um segundo que fosse, delineou um conjunto das tais reformas eleitorais e constitucionais para devolverem estabilidade e credibilidade à sociedade, mostrou que intenciona cortar os impostos sobre os salários pagos pelas empresas (aumentando a contratação), aumentar as prestações pagas pela segurança nacional aos desempregados e outros, sempre dentro de um discurso politicamente europeísta (assume a 1 de Junho a presidência rotativa da União), mas sempre confiante, incisivo e distinto.
Não sei como irá correr o mandato de Renzi, mas acredito que se há alguém que pode mudar a situação financeira e social italiana é este homem. Cada vez mais assistimos a “entradas” de personalidades jovens, desconhecidas para alguns, como mini-Ché Guevaras a corromper numa cada vez mais entranhada teia de corrução e lobbys, o que quase paradoxalmente, proporciona desconfiança e insegurança a grande parte do público. Porquê tanto medo do que é novo? Como podemos estar tão confortáveis com dúbio, com a velha mentira, com as estratégias que todos nós conhecemos? É por a conhecermos melhor? Não faz sentido.
O grande desafio de Renzi agora – e no futuro – é ser fiel a si mesmo. O charme por vezes engana (quem se lembra de Berlusconi no início?), e a coragem perde-se numa estrada de interesses próprios. Mais do que não acreditar nisso, a minha real esperança é que, de facto, isso não venha mesmo a acontecer. Talvez sejam os meus 19 anos a exprimirem a sua ingenuidade, mas acredito que ainda é possível existirem os revolucionistas românticos, em que as suas palavras são flechas ardentes nos peitos frios e cinzentos de tanta muralha social. Desde o Estádio José Alvalade, ao Parlamento italiano. Ou como diria o sábio Chico Buarque: "As pessoas têm medo da mudança. Eu tenho medo que as coisas nunca mudem."
*Rottamazione – equivalente a mandar para a sucata o que é velho.
Etiquetas:
Bruno de Carvalho | Sporting | SAD | Portugal | Itália | Reformas | Recessão | Matteo Renzi | Renzi | Primeiro-Ministro | PD | Parlamento | Berlusconi | União Europeia